Governo e Congresso Nacional têm até o final do mês para fechar regras sobre a execução das emendas parlamentares, conforme estabelecido no pacto entre os Três Poderes firmado no Supremo Tribunal Federal (STF).
A reunião atingiu alguns consensos sobre transparência e delimitação de uso do dinheiro. Ficou faltando definir os seguintes pontos:
- os critérios para configurar o pagamento obrigatório das emendas (a chamada impositividade), no caso das emendas individuais e de bancada;
- o procedimento a ser adotado por Legislativo e Executivo para, de “comum acordo”, destinarem valores das emendas de comissão a projetos considerados de interesse nacional ou regional.
O prazo para apresentar as propostas é de dez dias, contados a partir da data da reunião entre ministros do STF, cúpula do Congresso e representantes do governo, em 20 de agosto.
Uma vez apresentados os pontos em aberto, o relator das ações na Corte que tratam do tema, ministro Flávio Dino, deverá consolidar o que foi acordado e enviar para manifestação da Advocacia-Geral da União (AGU) e Procuradoria-geral da República (PGR).
Depois, o conteúdo do acordo deverá ser julgado direto no plenário do STF. A palavra final caberá a essa análise colegiada dos ministros.
Ainda não há data para esse julgamento. Até lá, as decisões liminares (provisórias) de Dino devem continuar em vigor. Isso significa que as emendas continuam suspensas até a definição do julgamento.
Um outro ponto que ficou em aberto diz respeito à limitação do crescimento das emendas. A nota conjunta dos Poderes depois da reunião não fixou prazo para esse ajuste.
Ficou decidido que as emendas não poderão crescer em proporção maior ao aumento do total das despesas discricionárias (aqueles gastos que não são obrigatórios, como investimento e custeio).
Recuo
Para a diretora de programas da ONG Transparência Brasil, Marina Atoji, a formatação do acordo divulgado pelos Poderes “soa como um recuo”.
“A gente ficou um pouco decepcionado nesse sentido de que esperávamos algo mais estruturante, ou uma decisão que mexesse mais com a composição e a forma como as emendas hoje estão colocadas, e não só em relação à transparência e prestação de contas”, afirmou à CNN.
A Transparência Brasil foi uma das entidades responsáveis por provocar o STF argumentando que havia um desrespeito da decisão da Corte que considerou inconstitucional a prática do “orçamento secreto”.
Conforme Atoji, o pacto entre os Poderes sobre as emendas “recuou e baixou o tom” em relação a medidas que haviam sido determinadas por Dino nas liminares e confirmadas pela unanimidade dos ministros.
Um dos exemplos disso são as exigências para execução das “emendas Pix” – aquelas que permitem a transferência direta do dinheiro a estados e municípios, sem fiscalização e sem o controle de execução orçamentária.
Pela decisão liminar, os beneficiários dessa emenda teriam que fornecer uma série de informações prévias ao recebimento do dinheiro (plano de trabalho, objeto a ser executado, finalidade, a estimativa de recursos para a execução e o prazo da execução).
Pelo acordo dos Poderes, ficou estabelecido que a transferência via “emendas Pix” devem observar a “necessidade de identificação antecipada do objeto”, priorizando-se obras inacabadas e com a prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União (TCU).
“São coisas que já estão dadas, não são cumpridas e não se avança muito”, disse Atoji, referindo-se ao fato de que os pontos acordados já estão previstos em regras do Congresso e na Lei de Diretrizes Orçamentárias. “Do Supremo se esperava um pouco mais de assertividade, pela própria competência da Corte”.
“A gente vê com preocupação o fato de ter havido essa conversa a portas fechadas, sobre um tema que tem a ver com transparência, prestação de contas, e que próprio Supremo tinha referendado por unanimidade”, declarou.
O que já se tem de consenso
Representantes dos Três Poderes da República almoçaram na tarde de terça-feira (20) no STF para discutir o embate em torno das regras para liberação de dinheiro das emendas parlamentares.
Em nota conjunta divulgada, STF, Congresso e governo disseram que firmou-se um “consenso de que as emendas parlamentares deverão respeitar critérios de transparência, rastreabilidade e correção”.
As emendas individuais ficam mantidas e continuam sendo impositivas (de execução obrigatória).
O acordo decidiu as seguintes regras para execução das emendas:
- Emendas Pix: deve haver a identificação prévia do objeto do gasto. Haverá prioridade para obras inacabadas e as contas devem ser prestadas perante o TCU;
- Emendas individuais: governo e Congresso devem definir, em dez dias, critério objetivos para identificar o que são os chamados “impedimentos de ordem técnica”, que impedem a execução obrigatória de valores programados pelo orçamento;
- Emendas de bancada: devem ser destinadas a “projetos estruturantes” em cada Estado e no Distrito Federal, de acordo com a definição da bancada, vedada a individualização (indicação individual por cada congressista, pulverizando o gasto);
- Emendas de comissão: passam a ser destinadas a projetos de interesse nacional ou regional, definidos “de comum acordo” entre Legislativo e Executivo, conforme procedimentos a serem estabelecidos em até dez dias.
Valores
O pano de fundo do embate sobre as emendas é o controle cada vez maior do orçamento público da União pelo Legislativo.
Segundo o presidente do STF, ministro Roberto Barroso, um dos consensos possíveis a que os poderes chegaram na reunião foi a manutenção de um papel “importante” do Congresso em alocar recursos do orçamento.
O assunto já havia sido tratado de passagem no plenário do STF pelo próprio Dino.
Em sessão de 13 de março, ele disse que a Corte tinha um “encontro marcado com tema da parlamentarizarão da elaboração orçamentária no Brasil”. Segundo o magistrado, parte da Lei Orçamentário “está virando emenda parlamentar”.
Para o ano de 2024, as emendas individuais somaram cerca de R$ 25 bilhões no Orçamento. Esse total inclui as “emendas Pix” e os demais repasses com finalidade definida.
As “emendas Pix” somam cerca de R$ 8,2 bilhões. De acordo com o Portal da Transparência do governo federal, a maioria dos recursos já foi liberada, cerca de R$ 7,6 bilhões. Desse montante, R$ 4,4 bilhões já foram pagos.
Já as emendas de bancada têm um total de R$ 8,5 bilhões. As de comissão, R$ 15,5 bilhões.
CNN BRASIL