O ex-chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação, órgão criado no TSE, afirmou que teme alguma retaliação do ministro Alexandre de Moraes. Perito em crimes cibernéticos, Eduardo Tagliaferro era responsável pela apuração e elaboração de relatórios encomendados por Alexandre de Moraes.
“Dr. Kuntz [advogado] tem essa preocupação. Ele defende outras pessoas em casos conduzidos pelo ministro Alexandre e alguns de seus clientes já passaram uma temporada presos, mesmo sem a concordância da Procuradoria Geral da República. Caso isso aconteça, na visão dele, seria mais uma oportunidade em que, infelizmente, o ministro demonstraria que se afasta ao respeito das leis e da história de compromisso do supremo com as garantias constitucionais”, afirmou Tagliaferro.
Ele acrescentou: “Compareci quando fui chamado, dei todos os esclarecimentos, tenho residência fixa, trabalho com perícias para diversos tribunais do País, não faz sentido algum atrapalhar as investigações e tenho interesse que os responsáveis pelo vazamento do meu telefone e a sua consequente inutilização sejam identificados e responsabilizados. Mas, apesar disso tudo, tenho medo sim”.
O ex-funcionário do TSE relatou à CNN um pouco do trabalho dele no tribunal e disse que em vários momentos achou algumas coisas estranhas, mas que cumpria ordens.
“Estava no TSE, as eleições foram uma loucura. A carga de trabalho absurda e havia uma chuva de demandas vindas de muitas pessoas. Muitas vezes tinha a sensação de que alguns pedidos não eram ligados às eleições ou com questões do TSE sim. Questionei meus superiores e me foi explicado que estava tudo certo, não havia problema nenhum e que era para seguir apenas fazendo o meu trabalho. Não questionei e busquei fazer o meu melhor, sem maiores ponderações.”
Tagliaferro concluiu, “espero que eles realmente estejam certos e não tenha cometido nenhuma ilegalidade sendo induzido a erro. Vários momentos achei algumas coisas estranhas, mas cumpria ordens. Espero que não tenha feito nada de irregular”.
À CNN, o advogado de Eduardo Tagliaferro, Eduardo Kuntz, afirmou que irá pedir o trancamento do inquérito. “Vou buscar o trancamento deste inquérito. Ele foi instaurado em absoluta contrariedade ao Regimento Interno do Supremo. O único ministro que pode instaurar inquéritos de ofício é o presidente. Caso o faça, deve encaminhar ao distribuir e ser sorteado para um dos outros 10 ministros.”
A defesa de Tagliaferro também criticou a condução do ministro Alexandre de Moraes. “Com todo respeito, mais uma vez, o ministro Moraes abusa de seu poder de manipular o sistema e atua em caso que tem interesse pessoal direto de ofício. Inclusive, sem a concordância da Procuradoria Geral da República. Isso precisa acabar e as leis precisam voltar a serem respeitadas urgentemente.”
Em depoimento à PF na última quinta-feira (22), Tagliaferro disse que, na ocasião, entregou o aparelho a um compadre – que depois foi procurado pelo delegado José Luiz Antunes para que entregasse o dispositivo.
Segundo Tagliaferro, o delegado teria dito ao seu compadre que “havia chegado uma ordem” do próprio Moraes para que o celular fosse encaminhado para o seu gabinete em Brasília.
Isso, no entanto, não aconteceu – tanto que o celular ficou com a Polícia Civil e foi entregue a Tagliaferro posteriormente, “fora de qualquer invólucro, saco plástico, lacre etc.”
O inquérito foi aberto por Moraes depois que o jornal Folha de S. Paulo revelou mensagens que apontam que o setor de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral foi demandado de forma não oficial pelo gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante e após as eleições de 2022.
Moraes afirma não haver ilegalidade. Os ministros Flávio Dino, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia, além da Procuradoria-Geral da República, defenderam publicamente o colega.
A CNN procurou a assessoria de imprensa do STF sobre as falas de Tagliaferro e o advogado e aguarda retorno.
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